O Porquê dos blogues
Estava eu muito sossegado com as minhas lides académicas, quando recebi um mail do Nuno Jerónimo a perguntar:"Vai um Blogue?" Ainda pensei tratar-se de uma oferta de serviços sexuais inovadores, mas não. Nunca tive essa sorte e, atendendo à história da minha vida, vou continuar com essa fracturante questão por resolver.
Assim, como alternativa a uma série de experiências sexuais divertidas e criativas, olha, canalizei o líbido para esta coisa dos blogues.
E daí para a frente, graças ao blogue, tem sido um rodopio de êxitos que me deixa quase sem respiração. Um pouco como naquelas cenas que a gente descobre na net quando anda a fazer investigação sobre a anatomia feminina e encontra uma senhoras com um índice de massa corporal um bocadinho acima do percentil, sentadas na cara duns cavalheiros que se voluntariam para o papel de sofá. Os blogues, então. Tirando aquela coisa do Pacheco Pereira que eu também era capaz de fazer, se me desse ao trabalho de fazer copy/paste de todas as mensagens que recebo para umas férias de sonho na Ericeira ou na Foz do Arelho, umas pomadas milagrosas para aumentar o comprimento do meu pénis, ofertas de parcerias em negócios magníficos com as viúvas e orfãos de generais recentemente falecidos no Sudão, Nigéria e Serra Leoa, o meu blogue ficava grande. Enorme. E talvez ficasse a ser referido respeitosamente pela concorrência. Outro processo igualmente satisfatório para ter um blogue respeitável, aparentemente passa por despejar artigos legislativos inteiros, despachos, leis e decretos-lei, intercalados com uns comentários sagazes sobre a 5ª Lei da Termodinâmica ou sobre as várias conspirações em curso no mundo de hoje - desde os descendentes da Maria Madalena aos tipos de avental, dos experts de Roswell e da área 51 aos comensais de Bildelberg.
Especialmente a coisa da 5ªLei da Termodinâmica...acho que tal lei não existe, mas se eu escrever um discurso assertivo e autoritário sobre o assunto e me puser a desancar o Insigne (e inexistente) Professor Edvaard Olfsen e os seus (inexistentes) assistentes da mítica (e inexistente) Universidade da Colúmbia Espanhola, o pessoal vai acreditar em tudo e fica a olhar pra mim com um respeitinho do caraças. E assim pude construir um status académico e uma imagem pública de grande respeito e consideração, meus amigos.
Nah, tou a brincar...isto dos blogues é uma coisa muito, muito séria, e até devia haver uma lei, uma alta autoridade para os blogues, capacitada para emitir carteira e licença de publicação, porque isto assim, como está, é uma bandalheira pegada, qualquer miúdo com um computador ligado à banda larga (ou mesmo à banda estreita) pode-se pôr a blogar, e a encher a internet de bites e báites sem qualquer relevância para os profundos e angustiados pensamentos de pessoas eruditas e sérias que, complacentemente, se dignam partilhar com a plebe pequenos fragmentos da sua sabedoria. Tá mal. Devia haver uma lei para isto pá.
De regresso aos blogues. Em que raio estará um gajo (ou gaja) a pensar quando decide abrir o seu blogue? Autopromoção (já que os sacanas dos editores não reconhecem o meu génio, vão ver, publico aqui mesmo e os gajos vão arrancar os cabelos de raiva por não terem tido a visão empresarial, por terem ignorado este Saramago, esta JK Rowlings, que aqui verte a sua genealidade. Ah!)?
Necessidade de se exprimir? Falta de sexo? Narcisismo? Tempo a mais?
Será a política aquela coisa da participação e cidadania, e um gajo sem ter de levantar as nádegas da cadeira manda uns bitaites, clica no botãozinho de publish e pronto, o recado está dado? Como o escuteiro que arrasta a velha pela passadeira para cumprir a quota diária de boas acções? Será a possibilidade de divulgar umas histórias nojentas sobre as preferências sexuais do meu chefe, ou do presidente da junta, ou mesmo do clube de futebol do meu bairro, sem que haja grande risco de ser apanhado? A possibilidade de, graças ao anonimato, poder dar vazão ao meu alter-ego, um obcecado sexual de gabarito internacional postando fotos e textos de posições e variações do sexo, que na minha vidinha quotidiana eu não teria coragem sequer para insinuar ter ouvido falar em tais práticas?
Falei num rodopio de êxitos graças ao blogue, lá para trás, mas pensando melhor, se esses êxitos se traduzissem em cachets suculentos (de preferência sem ter de passar recibo), a coisa teria alguma graça. Assim, um gajo habilita-se a arranjar uns amigalhaços que editam revistas e que nos cravam uns textos sobre blogues...
Pelo menos arranjei o tal amigalhaço. Só por isso já valeu a pena.
Agora a sério (como se eu fosse capaz de escrever alguma coisa sem ser a sério...) esta coisa dos blogues, mesmo carregada de lixo e de cobardias encapotadas no anonimato, acaba por ser um espaço de liberdade individual, um sítio (se real ou virtual é uma questão irrelevante) onde podemos dizer,
berrar, vomitar o que nos vai na cabeça ou na alma. Tal como as redes de comunicação alternativas que surgiram espontaneamente após os atentados de Madrid, e que puseram a nu a contra-informação estatal, os blogues e a liberdade de expressão que (por enquanto) eles representam, faz-me lembrar as portas das retretes públicas nos tempos da outra senhora. No meio de muito lixo pornográfico, de muita indigência intelectual, encontrava-se poesia, encontravam-se palavras livres.
De certa forma, os blogues são as portas das retretes da pós-modernidade.
Texto de Jorge Bacelar in Psicologia Actual
Assim, como alternativa a uma série de experiências sexuais divertidas e criativas, olha, canalizei o líbido para esta coisa dos blogues.
E daí para a frente, graças ao blogue, tem sido um rodopio de êxitos que me deixa quase sem respiração. Um pouco como naquelas cenas que a gente descobre na net quando anda a fazer investigação sobre a anatomia feminina e encontra uma senhoras com um índice de massa corporal um bocadinho acima do percentil, sentadas na cara duns cavalheiros que se voluntariam para o papel de sofá. Os blogues, então. Tirando aquela coisa do Pacheco Pereira que eu também era capaz de fazer, se me desse ao trabalho de fazer copy/paste de todas as mensagens que recebo para umas férias de sonho na Ericeira ou na Foz do Arelho, umas pomadas milagrosas para aumentar o comprimento do meu pénis, ofertas de parcerias em negócios magníficos com as viúvas e orfãos de generais recentemente falecidos no Sudão, Nigéria e Serra Leoa, o meu blogue ficava grande. Enorme. E talvez ficasse a ser referido respeitosamente pela concorrência. Outro processo igualmente satisfatório para ter um blogue respeitável, aparentemente passa por despejar artigos legislativos inteiros, despachos, leis e decretos-lei, intercalados com uns comentários sagazes sobre a 5ª Lei da Termodinâmica ou sobre as várias conspirações em curso no mundo de hoje - desde os descendentes da Maria Madalena aos tipos de avental, dos experts de Roswell e da área 51 aos comensais de Bildelberg.
Especialmente a coisa da 5ªLei da Termodinâmica...acho que tal lei não existe, mas se eu escrever um discurso assertivo e autoritário sobre o assunto e me puser a desancar o Insigne (e inexistente) Professor Edvaard Olfsen e os seus (inexistentes) assistentes da mítica (e inexistente) Universidade da Colúmbia Espanhola, o pessoal vai acreditar em tudo e fica a olhar pra mim com um respeitinho do caraças. E assim pude construir um status académico e uma imagem pública de grande respeito e consideração, meus amigos.
Nah, tou a brincar...isto dos blogues é uma coisa muito, muito séria, e até devia haver uma lei, uma alta autoridade para os blogues, capacitada para emitir carteira e licença de publicação, porque isto assim, como está, é uma bandalheira pegada, qualquer miúdo com um computador ligado à banda larga (ou mesmo à banda estreita) pode-se pôr a blogar, e a encher a internet de bites e báites sem qualquer relevância para os profundos e angustiados pensamentos de pessoas eruditas e sérias que, complacentemente, se dignam partilhar com a plebe pequenos fragmentos da sua sabedoria. Tá mal. Devia haver uma lei para isto pá.
De regresso aos blogues. Em que raio estará um gajo (ou gaja) a pensar quando decide abrir o seu blogue? Autopromoção (já que os sacanas dos editores não reconhecem o meu génio, vão ver, publico aqui mesmo e os gajos vão arrancar os cabelos de raiva por não terem tido a visão empresarial, por terem ignorado este Saramago, esta JK Rowlings, que aqui verte a sua genealidade. Ah!)?
Necessidade de se exprimir? Falta de sexo? Narcisismo? Tempo a mais?
Será a política aquela coisa da participação e cidadania, e um gajo sem ter de levantar as nádegas da cadeira manda uns bitaites, clica no botãozinho de publish e pronto, o recado está dado? Como o escuteiro que arrasta a velha pela passadeira para cumprir a quota diária de boas acções? Será a possibilidade de divulgar umas histórias nojentas sobre as preferências sexuais do meu chefe, ou do presidente da junta, ou mesmo do clube de futebol do meu bairro, sem que haja grande risco de ser apanhado? A possibilidade de, graças ao anonimato, poder dar vazão ao meu alter-ego, um obcecado sexual de gabarito internacional postando fotos e textos de posições e variações do sexo, que na minha vidinha quotidiana eu não teria coragem sequer para insinuar ter ouvido falar em tais práticas?
Falei num rodopio de êxitos graças ao blogue, lá para trás, mas pensando melhor, se esses êxitos se traduzissem em cachets suculentos (de preferência sem ter de passar recibo), a coisa teria alguma graça. Assim, um gajo habilita-se a arranjar uns amigalhaços que editam revistas e que nos cravam uns textos sobre blogues...
Pelo menos arranjei o tal amigalhaço. Só por isso já valeu a pena.
Agora a sério (como se eu fosse capaz de escrever alguma coisa sem ser a sério...) esta coisa dos blogues, mesmo carregada de lixo e de cobardias encapotadas no anonimato, acaba por ser um espaço de liberdade individual, um sítio (se real ou virtual é uma questão irrelevante) onde podemos dizer,
berrar, vomitar o que nos vai na cabeça ou na alma. Tal como as redes de comunicação alternativas que surgiram espontaneamente após os atentados de Madrid, e que puseram a nu a contra-informação estatal, os blogues e a liberdade de expressão que (por enquanto) eles representam, faz-me lembrar as portas das retretes públicas nos tempos da outra senhora. No meio de muito lixo pornográfico, de muita indigência intelectual, encontrava-se poesia, encontravam-se palavras livres.
De certa forma, os blogues são as portas das retretes da pós-modernidade.
Texto de Jorge Bacelar in Psicologia Actual
2 comentários:
ok....
Já é hora de ter juizo...!
lol...eu deixei de ter juízo agora...mas quero lá saber!!!!
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